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Morto há 50 anos, Lupicínio Rodrigues vive na música do Brasil pela maestria ao versar sobre a inevitável sofrência

Postado em 25 de Agosto de 2024


Amargura, ressentimentos e desejos de vingança são recorrentes nas letras do cancioneiro do compositor gaúcho, também ótimo melodista.

? ANÁLISE – Sofrência era palavra inexistente no dicionário da música brasileira quando Lupicínio Rodrigues (16 de de setembro de 1914 – 26 de agosto de 1974) compôs, entre as décadas de 1940 e 1950, músicas que atravessariam gerações no imaginário nacional.

Mas já existia, claro, a dor de amor, a velha dor-de-cotovelo, matriz daquele que é tido oficialmente como o primeiro samba-canção, Linda flor (Ai, yoyô) (Henrique Vogeler, Luiz Peixoto e Marques Porto, 1929).

Como a Yoyô do pioneiro samba-canção, Lupicínio Rodrigues pareceu ter nascido para sofrer de amor.

E expiou a dor em letras diretas, doídas, escritas com altas doses de amargura e desejos de vingança.

É por isso que hoje, dia em que a morte do compositor gaúcho completa 50 anos, Lupicínio está com a obra viva.

Não somente pelas regravações, mas porque os sentimentos nada nobres que habitam o coração ferido no cancioneiro do autor reverberam em quase toda a música do Brasil, sobretudo em obras como a da sertaneja feminista Marilia Mendonça (1995 – 2021), voz quente que renovou o repertório da eterna dor-de-corno.

A diferença é que Marília rejeitou o papel de vilão que normalmente cabe à mulher no cancioneiro de Lupicínio e apontou o dedo para os homens.

Em sintonia com a moral machista da época em que viveu, o compositor muitas vezes se portou nas letras – algumas de disfarçado caráter biográfico, outras de inspiração nas dores alheias – como o macho orgulhoso que culpa a mulher pela traição e pelo infortúnio do amor a dois.

Mas é justo reconhecer que Lupicínio deu o braço e o coração a torcer num dos mais inspirados sambas-canção do autor, Volta (1957), reavivado em 1973 na voz imortal de Gal Costa (1945 – 2022). Também é justo reconhecer que a sobrevivência da obra de Lupicínio na alma popular e na discografia do Brasil extrapola o teor das letras das músicas geralmente compostas pelo artista sem parceiros.

Lupicínio Rodrigues também foi exímio melodista.

Basta ouvir sambas-canção como Nervos de aço (Lupicínio Rodrigues, 1947), Esses moços (Pobres moços) (1948), Vingança (1951), Nunca (1952), a já mencionada Volta (1957) e Ela disse-me assim (Vá embora) (1959) para atestar o encaixe preciso de letra e música.

O que justifica sucessivas regravações dessas músicas.

Se a dor é intensa, a melodia é depurada e segue caminho sempre original.

Principal criador da sofrência na música veiculada na era do rádio, Lupicínio Rodrigues segue vivo – 50 anos após a morte do compositor – porque música boa é atemporal, sobretudo se versar sobre abandono, (des)amor e rejeição, fatalidades das quais ninguém escapa.

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